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"O jogo do equity": participação societária se consolida como ativo estratégico

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redacao@justicaemfoco.com.br 09 de setembro de 2025
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Por Bruna Puga, advogada e sócia do escritório BP/F Law*

A chamada nova economia tem transformado não apenas os setores em expansão, mas também a própria forma de estruturar juridicamente os negócios. O crescimento acelerado de startups, a multiplicação de modelos inovadores e a entrada de capital por vias não convencionais abriram espaço para novas dinâmicas de sociedade. Tornou-se cada vez mais comum a troca de participação societária por serviços, visibilidade, conhecimento ou acesso a canais estratégicos.

Nesse cenário, o equity deixou de ser apenas uma questão contábil para assumir o papel de moeda de negociação fluida, frequentemente ancorada em ativos intangíveis, como reputação, influência ou rede de contatos. É o que alguns descrevem como o "jogo do equity": sócios que entram com moedas diferentes, mas precisam garantir que os resultados financeiros ou estratégicos permaneçam alinhados.

Esse movimento é visível na ascensão de estruturas híbridas, como as que envolvem sócios-operadores, investidores com papel estratégico, holdings familiares e até influenciadores digitais. A prática ganhou tração com a popularização do corporate venture capital, onde grandes empresas apostam em negócios inovadores, e com a valorização do chamado smart money, aquele capital que vem acompanhado de conexões, expertise e mentoria. A lógica é de construir valor somando competências distintas, mesmo que os aportes não sejam estritamente financeiros.

Segundo o relatório da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) em parceria com a TTR Data, as operações de venture capital no Brasil alcançaram R$ 9 bilhões de investimentos em 2024, um crescimento de 17% em relação a 2023, embora o número de rodadas tenha caído 46%, de 228 para 123. Esse cenário evidencia a necessidade de estruturas jurídicas robustas para atrair e gerir esses investimentos de forma sustentável.

A flexibilização do mercado é um avanço porque reduz barreiras e dá mais liberdade para os negócios crescerem, mas isso não significa que tudo possa ser feito de forma improvisada. O que acontece em muitos casos é que, na pressa de fechar acordos, empresas acabam usando contratos genéricos, sem prever pontos básicos como entrada e saída de sócios, critérios de participação ou regras de venda de quotas. Em vez de simplificar com estratégia, acabam criando fragilidade que mais cedo ou mais tarde gera conflito.

O problema não está na inovação, mas na informalidade. Ao aceitar sócios sem critérios claros, prometer participações futuras sem mecanismos de vesting, ou ignorar cláusulas básicas de governança, as empresas abrem margem para disputas jurídicas e desalinhamentos irreversíveis. A pressa por expandir muitas vezes atropela a necessidade de segurança jurídica mínima. Quando a estrutura é frágil, qualquer mudança no cenário, seja divergência entre sócios, entrada de um novo investidor ou uma proposta de aquisição, pode se transformar em crise.

Estruturar bem exige uma governança leve, mas eficiente, com contratos adaptados ao tipo societário e ao estágio do negócio, pode evitar conflitos e facilitar rodadas futuras de investimento. Cláusulas como vesting, lock-up, preferência, mecanismos de saída e resolução de impasses são ferramentas estratégicas, não entraves. Ignorá-las significa deixar o risco oculto crescer até se tornar incontornável.

Muitos negócios baseados em ativos intangíveis, como mídia, tecnologia ou propriedade intelectual, já nascem com o desafio de mensurar entregas e avaliar resultados. Isso exige acordos precisos, que definam o valor das contribuições, as condições de permanência e os critérios para a remuneração via equity. Se a entrada de um influenciador, mentor ou parceiro comercial é tratada apenas na informalidade, o espaço para conflitos aumenta, e o que era para ser diferencial competitivo vira um passivo. 

Em um ambiente onde o crescimento é veloz e os ativos são cada vez mais complexos, quem organiza bem suas relações internas ganha vantagem competitiva, reduz o risco de litígios e torna-se mais atraente para investidores e parceiros estratégicos. A aposta em equity pode, sim, ser uma via inteligente para alavancar negócios. Mas é preciso reconhecer que participação societária é um instrumento legal com efeitos profundos sobre a estrutura e o destino da empresa. Usá-la com estratégia, transparência e respaldo jurídico evita problemas e permite que a inovação se sustente a longo prazo.

*Bruna Puga é sócia do escritório BP/F Advogados, especialista em contratos empresariais e estruturação de negócios.

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