Por Bady Curi Neto
O Supremo Tribunal Federal decidiu, na quinta-feira (12.set.2024), que os condenados pelo Tribunal do Júri ou Júri Popular podem ser presos imediatamente após o veredito da decisão. Destaca-se que não são todas as condutas tipificadas em nosso Código Penal que estão sujeitas ao Júri Popular. O Tribunal do Júri é competente apenas para julgar os crimes dolosos contra a vida, tentados ou consumados.
Segundo a tese fixada pela mais alta corte de justiça, “A soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada”. À primeira vista, o resultado parece ser uma vitória da sociedade, cansada e atordoada com a violência que assola o país, com a impunidade e com a letargia do Poder Judiciário.
Os argumentos, com a devida vênia dos Ministros, que entenderam pela execução imediata da pena em razão da soberania do veredito do Tribunal do Júri, e daqueles que acham que o STF atendeu aos anseios da população, não se sustentam à luz da nossa Constituição Federal.
O Ministro Celso de Melo, em um julgamento de Habeas Corpus, em 2019, explicou que a soberania do veredicto do Tribunal do Juri não pode ser vista como absoluta, pois desta decisão cabe recurso.
Em seu voto, o Ministro Gilmar Mendes pontuou que, ainda que a apelação contra a “decisão dos jurados tenha cognição limitada, é por meio de tal recurso que o Tribunal de segundo grau poderá revisar a sentença, tanto em aspectos formais quanto materiais”. A esse respeito, importa destacar que pode o Tribunal, inclusive, determinar novo júri, se entender que a decisão foi totalmente contrária às provas dos autos.
Em outras palavras, o Tribunal poderá tanto reformar a decisão pelos aspectos formais (nulidades), quanto determinar a realização de novo júri. O que é vedado às instâncias superiores é modificar a conclusão do Juri Popular, retificando o veredito de culpado ou inocente.
O que se viu no entendimento dos votos vencedores foi uma afronta ao princípio da presunção de inocência esculpido no artigo 5º, LVII da CF que preceitua: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado”, em outras palavras, quando não couber mais recursos.
A interpretação distinta da norma Constitucional clara, evidente e autoaplicável dá margem ao judiciário alterar o , em afronta a separação dos poderes. A hermenêutica jurídica ensina que quando a lei é clara não se interpreta.
Esta constante afronta aos princípios e às normas constitucionais claras e autoaplicáveis, pelo Supremo Tribunal Federal, tem como consequência o denominado ativismo judicial, no qual o Poder Judiciário se imiscui nas atribuições dos demais poderes, por vezes, praticamente, legislando e alterando o sentido da lei e a vontade do Legislador.
Além do mais, se não houve motivos de decretar a prisão preventiva do acusado na fase inicial, difícil acreditar que haverá motivos da prisão após o veredito do júri, fazendo letra morta ao princípio da presunção de inocência. Apenas no campo das hipóteses, imagine-se que um condenado pelo Tribunal Popular seja levado a prisão. Após o recurso, o Tribunal anula a decisão, submetendo o réu a novo júri, sendo neste absolvido. Pergunta-se: - Quem irá indenizar a prisão de um inocentado? A razão de ser do Princípio da Presunção de Inocência é diminuir as possibilidades de erros judiciais que levem inocentes ao encarceramento.
Por último e não menos importante, é ressaltar que o juiz deve se curvar à e ao direito posto. Quanto a pressão popular, relembre-se o julgamento mais famoso da história, ocorrido há mais de 2000 anos. Pilatos, investido na função de julgador, rendeu-se à opinião pública, lavou suas mãos, soltou Barrabás e crucificou Jesus Cristo.
Tenho dito!!!
Bady Curi Neto, advogado fundador do Escritório Bady Curi Advocacia Empresarial, ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) e professor universitário.